domingo, 30 de maio de 2010

dos entreatos...

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in on it
in on it
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"a minha fé vem do outro
as dúvidas vêm de mim
e a poesia nos aproxima de alguma coisa que pode estar viva
acho que alguma coisa está acontecendo"

Fernando Eiras (Adaptado)
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cinco entretantos remotos

I
irmão:
palavra-vínculo
cheia de céu
cheia de azul
e eu nunca soube o que é isso

II
eu sou alérgico à solidão
e só tem um antídoto para isso
não é muito fácil conseguir
por causa disso
vivo doente

III
fui feliz algumas vezes
mas fui infeliz várias outras
e sempre vivi entre essas duas coisas

IV
as coisas costurando dentro de mim
as coisas mínimas que acontecem
e que tiram tudo do centro
do círculo
de dentro do círculo não vejo tudo direito
- nas margens me permito

V
quando criança
fugia pros lugares altos
fugia pro meio do mato
fugia pra dentro do quarto
fugia pra casa do vizinho
fugia pro fundo do quintal
fugia do tempo e das coisas doloridas
fugia fugia fugia fugia
alguém deve ter dito
vai virar poeta
virei

poesia é onde fugir sempre me salva
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sexta-feira, 28 de maio de 2010

das inversões...

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not normal
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"resistir à sombra
com a ferida aberta no ar

resistir-por-ninguém-e-por-nada
irreconhecido
para ti
somente

com tudo o que aí tem lugar
mesmo sem
linguagem"

Paul Celan: “Stehen”
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cinco compassos invertidos

I
na correnteza da vida
com certeza
eu sou um peixe
fora d'água

II
oras ouvir suas estrelas
e não apenas dizê-las

III
um piscar de olhos
seu único movimento
- foi breve a vida

IV
ontem
o gosto do café-com-vinho-do-porto
causou um aperto:
o álcool lembra ausências
deixa a marca das gentes-em-pó
ficaram saudades


V
desculpe
não sou inteligente
sou sensível
inteligência é consequência
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das intimidades...

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“we come from a place where we count the days”
fm belfast
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intradérmico

meu vício de falhar é bem aí
nas partes de dentro
nas vergonhas
quando exponho da roupa pra dentro
atrás da pele
atrás do couro espesso
aquele que a gente esconde
sempre
pra não ficar vermelho
de raiva
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quinta-feira, 27 de maio de 2010

dos absurdos...

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tv tells
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"quem fica olhando o frango girar,
ou é cachorro vira-lata
ou não quer comprar
ou quer comer com os olhos
porque quem tem boca foi a Roma”

@karvel & @piugibson
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sambinha (ou poema) do amor moderno

quem é você?
eu sou eu
é só adicionar água?
depende...
ou já vem pronto?
agite antes de usar?
ou já vem agitado?
estou confuso agora!
nem tem preparo exato
depende do ingrediente auxiliar
ou do mestre cuca
então tem bula?
modo de usar?
ou modo de ousar?
não
nem de ousar
é de pilha ou de corda?
bateria recarregável?
tem garantia?
bom...
não usa pilha, muito menos bateria e corda
ele é movido a emoções
e não há garantias
emoções recarregáveis?
carregáveis, pois preciso sempre de emoções muito fortes
não sobrevivo com uma só
emoções duráveis?
sim
é fácil de usar? tem 1001 utilidades?
muito difícil de usar
e as utilidades dependem sempre de quem o manusear
é tóxico? é aprovado pelo INMETRO, ANVISA, pelo FDA?
tem data de validade longa?
não há aprovação de ninguém, a não ser a minha
e a validade depende também se desejar
aprovação própria sem controle de qualidade conhecido
e validade indeterminada
o PROCON vai querer dar uma olhada
eu não sou registrado como um produto
então o PROCON nem se mete
então você é auto-aprovado e usado com responsabilidade
traz benefícios a saúde do coração
sim
onde encontro pra pedido imediato?
tem na internet?
no mercado?
na casa do vizinho do lado?
como só tem um, o estoque está em falta
mas sabendo conquistar, você pode ganhar a residência
vem embalado com "agradecemos a preferência"?
volte sempre?
fiado só amanhã?
"Servimos bem para servir sempre!"
garçom, uma porção de batatas fritas
e aquele moço ali do balcão
de boné azul pra acompanhar, por favor!
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quarta-feira, 26 de maio de 2010

das reinvenções...

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see me see you
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via pelos cantos...
a partir de um texto de Jorge Forbes

nem tudo se explica
tem um silêncio entre nós
a ponte da palavra não nos contém
vamos nos perder?
pode até ser que não
sobre esse silêncio podemos inventar
o limite da palavra é a invenção
tem tanta coisa boa no silêncio...
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das terapias...

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ofélia_03
photo "paul klee & me"
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"Revelar qualquer coisa sobre si mesmo é feio."
"Estou aqui para me violentar,
como na psicanálise,
como no confessionário."

In SOLO com Antônio Abujamra

"Entrar em análise é sair de uma moral dos costumes
e se instalar na ética do desejo."

Jorge Forbes
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NO_VICIADO

terapia:
revirar o lixo
feder o lixo
reciclar o lixo
ter-deixar-de-ser
lixo
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terça-feira, 25 de maio de 2010

dos alimentos...

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culinareae

eu fiz a cria do conto de casa
a panela de impressão da poesia
o cozimento da arte
parte por parte
da carne
em fogo brando e em papel branco e esses vapores
coitados
seus pedaços escritos
e soltos
sôfrego almoço de domingo difícil
de ser engolido
maldita alma de poeta
sempre crua
e nada de "se assarem" os ossos...
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segunda-feira, 24 de maio de 2010

das tarefas...

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"minha agenda
está cheia
muitas faltas,
mais preguiça"
in http://yfir.blogspot.com

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terapia

tenho que preencher algumas distâncias
que estão à sombra
queria
um passeio perto de uma coisa quente
com vento no rosto mas
o cobertor em dias frios pede companhia
- ficam as demoras só

(não são coisas boas
se trazem um susto)

um pouco longe
junto da cama quase
choro mas
com a roupa impermeável
dos outros
chorar pra quê?
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quarta-feira, 19 de maio de 2010

das distâncias...

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porque o querer é sempre maior que o esperar?
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3X3

love love love
longe longe longe
morre morre morre
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dos achados...

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arqueo_lógico

arqueo_lógico

...e esses pássaros
agarrados em mim
arrancados a dente
e pinças
nunca voam

acabam virando palavras
com asas cortadas

num fio de texto
eles coitados
quietos
se alinham:

ganham o imenso
e voam livres
(e só são livres)
poéticamente
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segunda-feira, 17 de maio de 2010

das intervenções...

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abrir a porta é ultrapassar a tentativa

cada palavra é uma arma
de brinquedo
e às vezes estão juntas
muitos
não prestam atenção nelas
e deixam passar
de assalto
sem deixar que elas aconteçam
de verdade

cada palavra
expande-se e deita
nas outras
é preciso estar só
e olhar
cada
uma

(para exprimir algo
você tem que esquecer
se)

as palavras não pedem
a rua
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das guerras...

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on_off
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"no início todos te perdoam
esperando que você cresça
esperando que você cresça
para nunca mais perdoá-lo"
Alberto da Cunha Melo

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batalha_dor

no amor
meu amigo
o inimigo
você deixa vivo
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domingo, 9 de maio de 2010

das continuidades...

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seguimento

miniadaptado de www.achuvaimovel.blogspot.com

mas se é a terra quem alimenta
essa fase amarela da vida
é aceitar nela
o colchão o cobertor e eu...
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das medidas...

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tamanho único

um metro
e setenta e cinco centimetros
oitenta e quatro quilos
com R.G. e C.I.C. indecifráveis
(quase nunca lembra)
no fundo da carteira
um furo e as moedas
vazam

tudo sustentado por
vinte e um gramas
via oral
todo dia
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sexta-feira, 7 de maio de 2010

dos instantes...

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lendo PAZ

nascida da palavra
a poesia se transforma em algo que a ultrapassa
se funde com o instante para melhor atravessá-lo
no instante poético
para sermos nós mesmos
somos outros
sem deixar de ser eu mesmo
viro árvore, carro, poste, ponte, vidro...
viro até a cara do outro
sem deixar de ser eu mesmo
de lado
assim a poesia não mais se encarna na palavra
- fica na vida
faz com que todo instante seja poético
um poema é uma quase presença
um quase eu no outro
uma fecundação, feto, ovo
a poesia é início
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das inteligências...

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blackxenergy
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das inteligências

algumas vezes
se alguém vai fundo demais
em alguma coisa
a coisa fica feia
chata
ou monótona

nesses casos
prefiro superfícies
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dos elementos...

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a letra um número

um diz, outro conta
um percebe, outro quantidade
um anota, outro nota
um mundo de letras participa
um mundo de números
significa
um interno, outro externo
um inválido, outro válido
um contém um todo
o outro
engana
tudo
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segunda-feira, 3 de maio de 2010

das tintas...

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náufrago plural

água sobre o mar
de chuva ou de névoa
nada a declarar
visualmente
video
duvido

a tinta fala muito mais
quando ondas fazem
palavras

bebo segredos:
liquido-me
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domingo, 2 de maio de 2010

das origens...

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trees & tapes
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“Todas as famílias felizes se parecem, cada a família infeliz é infeliz à sua própria maneira”
Anna Karenina, Leon Tolstói

os dias origens
Inspirado no original de Jorge Luis Borges

quase nada sei sobre meu passado vago
de possíveis portugueses, os Carvalhos - talvez judeus novos
que prosseguem em minha carne, tecla, vírus e página
estranho seus hábitos, rigores e temores
tênues como se nunca tivessem existido árvores
uns carvalhos decepados e outros antigos falecidos - outros vivos
melhor assim continuar na terra o tempo hábil
sendo sábio e deixar de lado raízes vencidas e acordar as novas
inteiras e fazer-se na terra uma firmeza de galhos fortes
e ir ao céu como se fosse outro
e ter os olhos como se fosse ouro
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